Dando continuação a odisseia transamazônica o primeiro ciclo da borracha no período entre o ano de 1879 a 1912 segunda Parte.
Durante os primeiros quatro séculos e meio do descobrimento, como não foram encontradas riquezas de ouro ou minerais preciosos na Amazônia, as populações da hileia brasileira viviam praticamente em isolamento, porque nem a coroa portuguesa e, posteriormente, nem o império brasileiro conseguiram concretizar ações governamentais que incentivassem o progresso na região.
Vivendo do extrativismo vegetal, a economia regional se desenvolveu por ciclos (Drogas do sertão), acompanhando o interesse do mercado nos diversos recursos naturais da região.
Para extração da borracha neste período, acontece uma migração de nordestinos, principalmente do Ceará, pois o estado sofria as consequências das secas do final do século XIX.
O desenvolvimento tecnológico e a Revolução Industrial, na Europa, foram o estopim que fizeram da borracha natural, até então um produto exclusivo da Amazônia, um produto muito procurado e valorizado, gerando lucros e dividendos a quem quer que se aventurasse neste comércio.
Desde o início da segunda metade do século XIX, a borracha passou a exercer forte atração sobre empreendedores visionários. A atividade extrativista do látex na Amazônia revelou-se de imediato muito lucrativa. A borracha natural logo conquistou um lugar de destaque nas indústrias da Europa e da América do Norte, alcançando elevado preço. Isto fez com que diversas pessoas viessem ao Brasil na intenção de conhecer a seringueira e os métodos e processos de extração, a fim de tentar também lucrar de alguma forma com esta riqueza.
A partir da extração da borracha surgiram várias urbes e povoados, depois foram transformados em cidades. Belém e Manaus, que já existiam, passaram então por importante transformação e urbanização. Manaus e Belém foram umas das primeiras cidades do Brasil ainda no final do século XIX, a introduzir a eletricidade na iluminação pública, criando viabilidade para a instalação dos bondes elétricos.
A ideia de construir uma ferrovia nas margens dos rios Madeira e Mamoré surgiu na Bolívia, em 1846. Como o país não tinha como escoar a produção de borracha por seu território, era necessário criar alguma alternativa que possibilitasse exportar a borracha através do Oceano Atlântico.
A ideia inicial optava pela via da navegação fluvial, subindo o rio Mamoré em território boliviano e depois pelo rio Madeira, no Brasil. Mas o percurso fluvial tinha grandes obstáculos: vinte cachoeiras impediam a navegação. E foi aí que cogitou-se a construção de uma estrada de ferro que cobrisse por terra o trecho problemático.
Em 1867, no Brasil, também visando encontrar algum meio que favorecesse o transporte da borracha, os engenheiros José e Francisco Keller organizaram uma grande expedição, explorando a região das cachoeiras do rio Madeira para delimitar o melhor traçado, visando também a instalação de uma ferrovia.
Embora a ideia da navegação fluvial fosse complicada, em 1869, o engenheiro estadunidense George Earl Church obteve do governo da Bolívia a concessão para criar e explorar uma empresa de navegação que ligasse os rios Mamoré e Madeira. Mas, não muito tempo depois, vendo as dificuldades reais desta empreitada, os planos foram definitivamente mudados para a construção de uma ferrovia.
As negociações avançam e, ainda em 1870, o mesmo Church recebe do governo brasileiro a permissão para construir então uma ferrovia ao longo das cachoeiras do Rio Madeira.
O exagero do extrativismo descontrolado da borracha alimentada pelo aquecimento da indústria automobilística dos Estados Unidos, estava em vias de provocar um conflito internacional, onde os trabalhadores brasileiros cada vez mais adentravam nas florestas do território da Bolívia em busca de novas seringueiras, gerando conflitos e lutas por questões fronteiriças no final do século XIX, sendo chamados de Questão do Acre, que exigiram inclusive a presença do exército, liderado pelo militar José Plácido de Castro.
A república brasileira, recém proclamada, tirava o máximo proveito das riquezas obtidas com a venda da borracha, mas a Questão do Acre preocupava. Então houve a intervenção do diplomata Barão do Rio Branco e do embaixador Assis Brasil, em parte financiados pelos Barões da borracha, que culminou na assinatura do Tratado de Petrópolis em novembro de 1903 em negociação conduzida pelo barão de Rio Branco, no governo do presidente Rodrigues Alves.
Pondo fim à contenda com a Bolívia, efetivando a compra do território por 2 milhões de libras esterlinas, garantindo o efetivo controle e a posse das terras e florestas do Acre por parte do Brasil, em troca das terras de Mato Grosso e do compromisso de construir uma ferrovia que superasse o trecho encachoeirado do rio Madeira e que possibilitasse o acesso das mercadorias bolivianas (sendo a borracha o principal), aos portos brasileiros do Atlântico (inicialmente Belém do Pará, na foz do rio Amazonas).
As cidades deste novo Estado foram então nomeadas com os personagens da Questão Acre, a capital recebeu o nome de Rio Branco e dois municípios receberam o nome de Assis Brasil e Plácido de Castro.
A ferrovia Madeira-Mamoré, também conhecida como Ferrovia do Diabo por ter causado a morte de cerca de seis mil trabalhadores (comenta a lenda que foi um trabalhador morto para cada dormente fixado nos trilhos), foi encampada pelo megaempresário estadunidense Percival Farquhar. A construção da ferrovia iniciou-se em 1907 durante o governo de Affonso Penna e foi um dos episódios mais significativos da história da ocupação da Amazônia, revelando a clara tentativa de integrá-la ao mercado mundial através da comercialização da borracha.
Em 30 de abril de 1912 foi inaugurado o último trecho da estrada de ferro Madeira-Mamoré. Tal ocasião registra a chegada do primeiro comboio à cidade de Guajará-Mirim, fundada nessa mesma data.
Mas o destino da ferrovia que foi construída com o propósito principal de escoar a borracha e outros produtos da região amazônica, tanto da Bolívia quanto do Brasil, para os portos do Atlântico, e que dizimara milhares de vidas, foi o pior possível.
Primeiro, porque o preço do látex caiu vertiginosamente no mercado mundial, inviabilizando o comércio da borracha da Amazônia. Depois, devido ao fato de que o transporte de outros produtos que poderia ser feito pela Madeira-Mamoré foi deslocado para outras duas estradas de ferro (uma delas construída no Chile e outra na Argentina) e para o Canal do Panamá, que entrou em atividade em 15 de agosto de 1914.
Alie-se a esta conjuntura o fator natureza: a própria floresta amazônica, com seu alto índice de precipitação pluviométrica, se encarregou de destruir trechos inteiros dos trilhos, aterros e pontes, tomando de volta para si grande parte do trajeto que o homem insistira em abrir para construir a Madeira-Mamoré.
A ferrovia foi desativada parcialmente na década de 1930 e totalmente em 1972, ano em que foi inaugurada a Rodovia Transamazônica (BR-230). Atualmente, de um total de 364 quilômetros de extensão, restam apenas 7 quilômetros ativos, que são utilizados para fins turísticos.
A população rondoniense luta para que a tão sonhada revitalização da EFMM saia do papel, mas até à data 1º de dezembro de 2006 a obra ainda nem havia começado. A falta de interesse dos órgãos públicos, em especial das prefeituras, e a burocracia impedem o projeto.
A constante exploração e valorização da borracha amazônica, possibilitou um rápido desenvolvimento econômico da região, principalmente no desenvolvimento da cidade de Belém em centro urbano, sob o comando do intendente Antônio Lemos, que mais foi influenciada pelo modelo estético Europa, sobretudo o francês. Absorvendo o modo de vestir e a arquitetura, baseada no estilo Art Noveau, o que a tornou a cidade brasileira mais europeia. Posteriormente, as transformações ocorreram na cidade de Manaus, caracterizando o período de ouro Belle Époque Amazônica.
As cidades de Belém e Manaus, na época eram consideradas as cidades brasileiras mais desenvolvidas do Brasil. A planta da cidade de Manaus passou a ser construída em moldes dos padrões europeus. As ações do governo, a riqueza e o poder foram concentrados na cidade de Manaus, dando pouco importância ao interior do Estado, relegando ao esquecimento, onde os trabalhadores dos seringais tornaram-se prisioneiros do sistema patronal, sem meios para saldar suas dívidas. Ambas possuíam luz elétrica, sistema de água encanada e esgotos.
Viveram seu apogeu entre 1890 e 1920, gozando de tecnologias que outras cidades do sul e sudeste do Brasil ainda não possuíam, tais como bondes elétricos, boulevard, avenidas sobre pântanos aterrados, além de edifícios imponentes e luxuosos, como por exemplo, em Manaus: o Teatro Amazonas, o Palácio do Governo, o Mercado Municipal e o prédio da Alfândega, em Belém: o Mercado de São Brás, Mercado Francisco Bolonha, Teatro da Paz, Palácio Antônio Lemos, corredores de mangueiras e diversos palacetes residenciais, construídos em boa parte pelo intendente Antônio Lemos, o Grande Hotel, o Cinema Olympia (a mais antiga casa brasileira de exibição de filmes), inaugurado no auge do cinema mudo internacional em 1912.
A influência européia logo se fez notar em Manaus e Belém, na arquitetura da construções e no estilo de vida, fazendo do século XIX a melhor fase econômica vivida por ambas cidades. A Amazônia era responsável, nessa época, por quase 40% de toda a exportação brasileira. Os novos ricos de Manaus tornaram a cidade a capital mundial da venda de diamantes. Graças à borracha, a renda per capita de Manaus era duas vezes superior à da região produtora de café (São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo).
Moeda da borracha: libra esterlina: como forma de pagamento pela exportação da borracha, os seringalistas recebiam em libra esterlina (£), moeda do Reino Unido, que inclusive era a mesma que circulava em Manaus e Belém durante a Belle Époque amazônica.
A Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, terminada em 1912, já chegava tarde. A Amazônia já estava perdendo a primazia do monopólio de produção da borracha, porque os seringais plantados pelos ingleses na Malásia, no Ceilão e na África tropical durante o período de crescente valorização da borracha no cenário internacional, com sementes oriundas da própria Amazônia, passaram a produzir látex com maior eficiência e produtividade. Conseqüentemente, com custos menores e preço final menor, o que os fez assumir o controle do comércio mundial do produto, superando a brasileira.
A borracha natural da Amazônia passou a ter um preço proibitivo no mercado mundial, tendo como reflexo imediato a estagnação da economia regional. A crise da borracha tornou-se ainda maior porque a falta de visão empresarial e governamental resultou na ausência de alternativas que possibilitassem o desenvolvimento regional, tendo como consequência imediata a estagnação também das cidades. A falta não pode ser atribuída apenas aos empresários chamados Barões da Borracha e à classe dominante em geral, mas também ao governo e políticos que não incentivaram a criação de projetos administrativos que gerassem um planejamento e um desenvolvimento sustentado da atividade de extração do látex.
Por sinal, desde a época do Governo Imperial que eram descartados projetos de incentivo à produção ou proteção da maior fonte de renda do Brasil no final do século XIX, superando o decadente ciclo do café. Devido o Governo Monárquico que era atrelado ao interesse econômico dos barões do café, que direcionava todos os esforços governamentais para manter a riqueza do sudeste brasileiro, mais influente ao poder que os barões da borracha. Atendendo ao pedido de industriais norte-americanos, também impediu que o governo do Pará criasse taxas alfandegárias protecionistas para os exportadores estrangeiros.
Com a República, pouca coisa mudou. O baixo peso político era contrastante com o poder financeiro do riquíssimo Norte. O Poder, concentrado no Sudeste brasileiro, passou a ser controlado pelos interesses econômicos dos cafeicultores e dos pecuaristas, resultando na política do café-com-leite, e excluindo os interesses dos barões da borracha (que também, pouco se movimentavam politicamente para serem incluídos, preferindo ir gastar seu dinheiro nos cassinos europeus [carece de fontes] do que investir em "lobbies" por acharem que o ciclo da borracha nunca acabaria).
Embora restando a ferrovia Madeira-Mamoré e as cidades de Porto Velho e Guajará-Mirim como herança deste apogeu, a crise econômica provocada pelo término do ciclo da borracha deixou marcas profundas em toda a região amazônica: queda na receita dos Estados, alto índice de desemprego, êxodo rural e urbano, sobrados e mansões completamente abandonados, e, principalmente, completa falta de expectativas em relação ao futuro para os que insistiram em permanecer na região.
Os trabalhadores dos seringais, agora desprovidos da renda da extração, fixaram-se na periferia de Manaus em busca de melhores condições de vida. Por volta de 1920, começaram a formar o que seria chamado de cidade flutuante, que se consolidaria até a década de 1960.
O governo central do Brasil até criou um órgão com o objetivo de contornar a crise, chamado Superintendência de Defesa da Borracha, mas esta superintendência foi ineficiente e não conseguiu garantir ganhos reais, sendo, por esta razão, desativada não muito tempo depois de sua criação.
A partir do final da década de 1920, Henry Ford, o pioneiro da indústria americana de automóveis, empreendeu o cultivo de seringais na Amazônia criando 1927 a cidade de Fordlândia e posteriormente (1934) Belterra, no Oeste do Pará, especialmente para este fim, com técnicas de cultivo e cuidados especiais, mas a iniciativa não logrou êxito já que a plantação foi atacada por uma praga na folhagem conhecida como mal-de-folhas, causada pelo fungo Microcyclus ulei.
Por: Portal Pérola do Xingu
Fonte: (fotos e fontes; Amadeu Hermes)
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