O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou, nessa segunda-feira (11), ação em que pede à Justiça decisão urgente para proibir a União de implantar o modelo de governança estabelecido pelo governo federal para o Plano de Desenvolvimento Regional Sustentável do Xingu (PDRS-X), no Pará, em outubro do ano passado.
Segundo o MPF, o modelo editado em outubro de 2020 pelo governo federal reduz a participação da sociedade civil no processo decisório e confere menor peso à participação do estado do Pará e dos municípios da área de abrangência do plano. Na ação, o MPF pede que a Justiça obrigue a implantação de um modelo de governança sem essas irregularidades.
Criado em 2010, o PDRS-X é o principal instrumento usado pelo governo e pela empresa responsável pela hidrelétrica de Belo Monte, a Norte Energia, para gerenciar e aplicar recursos na região impactada pela obra. Na criação do plano, a Norte Energia foi obrigada a investir R$ 500 milhões no PDRS-X, em um prazo de 20 anos. Desse total, cerca de R$ 205 milhões ainda estão pendentes de destinação e aproximadamente outros R$ 71 milhões estão comprometidos com projetos já aprovados mas com execução não iniciada ou não concluída.
Criado em 2010, o PDRS-X é o principal instrumento usado pelo governo e pela empresa responsável pela hidrelétrica de Belo Monte, a Norte Energia, para gerenciar e aplicar recursos na região impactada pela obra. |
Modelo paritário – Na ação, o MPF pede que a Justiça obrigue a União a instituir, dentro de 30 dias, modelo de governança que contemple composição paritária entre membros estatais e da sociedade civil, e entre os membros estatais oriundos das esferas federativas federal, estadual e municipal.
O novo modelo deve respeitar a exigência de diversidade e representatividade adequada dos atores oriundos da sociedade civil, alcançando, no mínimo, povos indígenas, comunidades tradicionais, movimentos sociais e entidades que se dediquem à tutela ambiental, defende o MPF.
Segundo o pedido da ação assinada pelo procurador da República Matheus de Andrade Bueno, o novo modelo também deve prever a instituição de Câmaras Técnicas que valorizem as experiências locais específicas em matérias de relevância para o PDRS-X, e a ausência de voto de qualidade, coordenadoria nata ou qualquer outra medida que, direta ou indiretamente, comprometa a efetiva igualdade de oportunidades no processo deliberativo.
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Vozes silenciadas – Na criação do PDRS-X, em 2010, compunham a governança do plano 15 representações estatais e 15 representações da sociedade civil. Entre as representações estatais, eram cinco de cada nível federativo.
Em maio de 2019, o governo federal revogou a constituição do comitê gestor do PDRS-X e, em outubro de 2020, decreto presidencial editou novo modelo de governança, com apenas quatro cadeiras para a sociedade civil entre o total de 13 representações integrantes do comitê gestor. O estado do Pará ficou com uma cadeira, e os municípios da região do Xingu também ficaram com apenas uma vaga no comitê.
“O que parece ter se pretendido foi realmente silenciar vozes opostas a concepções majoritárias circunstanciais”, critica o procurador da República Matheus de Andrade Bueno na ação. “Majoritárias apenas no plano federal, a propósito, porque também são substancialmente silenciadas vozes majoritárias dos planos estadual e municipal, igualmente democraticamente eleitas e de inegável relevância num colegiado que se afirma interfederativo”, complementa.
“Ao invés de convencer os pares de suas compreensões, a União Federal optou por simplesmente alterar unilateralmente as regras do jogo, modificando sensivelmente o quadro deliberativo e subtraindo da sociedade civil a possibilidade de real e efetiva influência nas decisões a cargo do comitê gestor”, aponta o MPF. “Pelo contido no Decreto, não há qualquer segurança de que grupos impactados pela UHE Belo Monte de fato sejam representados nesse processo”, destaca o texto da ação.
Em relatório, o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) reconheceu que as alterações de governança do PDRS-X configuram violação à essencialidade da democracia deliberativa, ferindo direitos e interesses de grupos vulneráveis beneficiados pelos projetos custeados pelo aludido plano, registra a ação do MPF.
Descaso já motivou ação – Em maio de 2020, após um ano de paralisação das atividades de governança do PDRS-X devido à revogação da constituição do comitê gestor, o MPF, o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), a Defensoria Pública da União (DPU) e a Defensoria Pública do Estado do Pará (DPE/PA) tiveram que recorrer à Justiça Federal para conseguir a liberação urgente de R$ 6 milhões do PDRS-X para o combate à covid-19 em Altamira e região.
No mesmo mês a Justiça Federal publicou decisão liminar determinando a liberação dos recursos, decisão confirmada em sentença prolatada ainda em outubro de 2020.
Os autores da ação destacam que se trata de verba federal, que fica em poder da empresa Norte Energia, destinada por lei ao desenvolvimento da região do Xingu, mas que estava parada “por absoluta desídia [falta de disposição, indolência, ociosidade] e descompromisso da União”.
Processo nº 1000028-76.2021.4.01.3903 – Justiça Federal em Altamira (PA)
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